Sistema Internacional

Todo dia 01 de janeiro se comemora do dia do domínio público. Tanto no Brasil quanto no exterior obras de grande relevância passam a fazer parte do gigantesco manancial de fontes livres de direitos autorais patrimoniais. Isso significa que qualquer pessoa pode publicar, remixar e distribuir essas obras sem pedir autorização nem pagar nada a ninguém. Contudo, é muito importante entender que regras são aplicáveis aqui no Brasil para não se violar direitos. E para isso, vamos ver um caso recente.

Quem leu sobre direitos autorais nos últimos vinte anos, ainda que sem muita profundidade, certamente se deparou com a história do Mickey Mouse. O que aconteceu foi o seguinte: em 1998, a Disney se deu conta de que seus desenhos animados começariam a entrar em domínio público nos Estados Unidos dali a cinco anos. O primeiro deles, o clássico Steamboat Willie [link: https://www.youtube.com/watch?v=BBgghnQF6E4], havia sido lançado em 1928 e a lei americana previa, naquele momento, proteção por 75 anos para obras desse gênero. Ou seja, a partir de 01/01/2004 haveria um efeito cascata nas obras audiovisuais da Disney, com filmes de 1928 entrando em domínio público em 2004, os de 1929 em 2005 e assim sucessivamente. Antes que o termo fosse atingido, a Disney liderou um esforço para mudar a lei de direitos autorais nos Estados Unidos.

A estratégia deu certo e o prazo de proteção foi aumentado em 20 anos. Foram 20 longos anos em que o domínio público ficou congelado nos Estados Unidos. Justo quando vimos a internet se desenvolver e apresentar inúmeras possibilidades de usos criativos de obras intelectuais e modelos de negócio inovador, a lei impediu - durante duas décadas – que essas obras fossem livremente usadas. A emenda legal foi aprovada por causa do Mickey, mas carregou a reboque toda a produção cultural dos anos 1920 e 1930, que já deveria estar em domínio público agora.

Finalmente, os vinte anos se esgotaram no início de 2019 [link: https://boingboing.net/2018/01/08/sonny-bono-is-dead.html]. As obras cujo uso foi por tanto tempo represado agora estão livres para serem usadas por quem quer que seja. Filmes como “Os Dez Mandamentos” (em sua versão em preto e branco, de 1923, a primeira dirigida pelo obstinado Cecil B. DeMille) e livros como “Assassinato no Campo de Golfe”, de Agatha Christie, podem ser livremente usados [link: https://law.duke.edu/cspd/publicdomainday/2019/?fbclid=IwAR2w6Ue8cBULwbmqaAWRma1PaBIGa9QQ1QNkYAof6ZcyW8opFUo_hXQwFSQ]. Assim, não apenas mais e melhores edições se tornam disponíveis ao público, mas essas obras também podem servir de matéria-prima para novos trabalhos, como tem acontecido frequentemente, por exemplo, com os textos de Jane Austen, em cujos livros as pessoas parecem sentir falta, por alguma razão desconhecida, de zumbis [link: https://pt.wikipedia.org/wiki/Pride_and_Prejudice_and_Zombies] e monstros marinhos [link: https://pt.wikipedia.org/wiki/Sense_and_Sensibility_and_Sea_Monsters].  Uma das vantagens do domínio público é essa: se você achar que pode fazer melhor ou fazer diferente, sinta-se à vontade e vá em frente. Contudo – e aqui reside nossa principal observação –, há que se estar atento às regras de cada país quanto à proteção autoral. No Brasil, os prazos são outros. Se a versão de “Os Dez Mandamentos” de 1923 já estava em domínio público no Brasil desde 1984, “Assassinato no Campo de Golfe”, da Agatha Christie, só entra em domínio público por aqui em 2047. Como isso é possível? Vem com a gente para entender.

Parte 2